Nina Campos trouxe para o CBTD que mulheres estão adoecendo. Aliás, não estamos falando apenas de diagnósticos clínicos, mas do esgotamento emocional, social e físico que acompanha a tentativa constante de equilibrar todas as esferas da vida. Trabalho, casa, filhos, aparência, autocuidado – tudo ao mesmo tempo, o tempo todo.
A fala de Campos mergulha nesse cenário e propõe um olhar transformador: não se trata de buscar o equilíbrio ideal, mas de reconhecer a corda bamba em que tantas caminham – e, principalmente, de parar de se culpar quando tropeçam.
“Aceitar a dinâmica da vida é preciso. A ‘depilação que você não fez, a escova que você não fez… você fará’”, provoca Nina, ao falar sobre a cobrança estética como reflexo de pressões sociais enraizadas.
A falsa promessa do equilíbrio
Quando se fala em equilíbrio, muitas mulheres visualizam uma balança: de um lado, trabalho; do outro, a vida pessoal. Mas essa imagem não representa a realidade.
Além disso, a metáfora correta, segundo Nina, é a de uma mulher em cima de uma corda, tentando manter em mãos todas as partes da vida – e, ainda assim, sendo julgada por qualquer sinal de desequilíbrio.
Esse esforço constante gera ansiedade, frustração e uma sensação crônica de inadequação. Então, idealiza-se uma vida perfeitamente organizada, mas, na prática, o planejamento excessivo leva à frustração. E a culpa recai, invariavelmente, sobre as próprias mulheres. Estamos vivendo em velocidade acelerada

Vivemos na era da dromologia – conceito que descreve a lógica da velocidade que rege o mundo contemporâneo. Portanto, tudo precisa ser rápido, eficiente, produtivo.
Mas, essa aceleração afeta diretamente o modo como as mulheres se sentem: sempre atrasadas, insuficientes, em comparação com uma régua inalcançável.
“A gente planeja, idealiza e se frustra. Estamos correndo para alcançar algo que nem sabemos se queremos, ou se precisamos mesmo”, reflete.
A desigualdade de gênero, ainda presente nos ciclos profissionais, só agrava esse cenário. Estudos da economista Claudia Goldin revelam que, mesmo dez anos após a maternidade, mulheres não retornam ao mesmo patamar profissional de antes – enquanto homens mantêm sua trajetória inalterada.
Nina Campos sobre o autocuidado como ato político
Campos também destaca a importância da reconexão consigo mesma como ponto de partida. Portanto, antes de qualquer coisa, é preciso estabelecer uma relação com o próprio corpo, com o próprio tempo. Ela propõe três dimensões essenciais para sustentar essa construção:
- Eu comigo;
- Eu com os outros;
- Eu com o mundo.
“A primeira relação que você precisa ter é com você. Sem isso, não há como estar bem com mais nada.” Autocuidado, aqui, não é luxo – é base. Comer bem, dormir, movimentar o corpo, cultivar o autoconhecimento. A vulnerabilidade precisa ser acolhida, e não escondida.
Entre afetar-se e envolver-se
Destaque também para a diferença entre afetar-se e envolver-se. No relato emocionante sobre o diagnóstico de câncer de uma amiga, Nina revela o desequilíbrio que ocorre quando, ao tentar ser forte para todos, esquecemos de ser cuidadas.
“Ela precisou pegar os outros no colo… mas quem cuidava dela? Empatia não é só sentir com o outro, é permitir que o outro sinta por você também.”
O olhar de Nina Campos sobre a mãe suficientemente boa e o legado necessário
Inspirada por Winnicott, Nina reforça que não é preciso ser a mãe perfeita – ser suficientemente boa já é um ato de resistência. É sobre ser presente, cuidadosa, amorosa, mas também humana, com limites e falhas.
Ela fecha com um chamado: precisamos simplificar as relações, fortalecer a sororidade e construir um legado para as próximas gerações. Então, isso só será possível quando mulheres apoiarem outras mulheres, especialmente as que enfrentam as camadas mais duras da desigualdade social.